Vamos entender aqui dois tipos de requeza para que possamos ter uma melhor visão do que é dito na carta de Tiago, capítulo cinco, onde ele diz que os ricos chorarão e sofrerão misérias por causa das suas riquezas.
Na visão judaica, riqueza não é definida apenas em termos de bens materiais ou acúmulo de dinheiro. Pensando como o povo judeu (o povo mais próspero da terra), a visão da Torá e dos Sábios é mais ampla e profunda.
1. Riqueza como satisfação interior
No Pirkei Avot (Ética dos Pais, 4:1), está escrito:
“Quem é o rico? Aquele que se alegra com a sua porção.”
Isso significa que a verdadeira riqueza é a capacidade de sentir contentamento com o que se tem, reconhecendo que tudo vem de D’us. A gratidão é a base da abundância.
2. Riqueza material como ferramenta
O judaísmo não demoniza a posse de bens. Pelo contrário, a Torá apresenta patriarcas como Avraham, Yitschac e Yaacov, que eram materialmente prósperos. Mas a riqueza material só tem valor quando é usada como instrumento de bondade (tzedaká, caridade) e de construção de um mundo mais justo.
A riqueza é um meio de servir a D’us, e não um fim em si mesma.
3. Riqueza espiritual
Os sábios também ensinam que a maior riqueza é o conhecimento da Torá e a prática das mitsvot (mandamentos). Essa é a “herança eterna” que não pode ser perdida ou roubada. O estudo e a conexão espiritual tornam a pessoa verdadeiramente rica, porque fortalecem sua identidade e seu propósito.
4. Riqueza como responsabilidade
No judaísmo, possuir recursos é visto como uma responsabilidade moral. Quanto mais alguém recebe, mais é chamado a compartilhar. A tzedaká não é apenas filantropia opcional, mas uma obrigação sagrada. Assim, a riqueza é medida também pela generosidade e pelo impacto positivo que se causa no próximo.
5. Riqueza como equilíbrio
A tradição judaica enfatiza que a pessoa deve buscar o equilíbrio: trabalhar e prosperar no mundo físico, mas sem se escravizar à ganância ou à inveja. A verdadeira riqueza está em viver em harmonia — consigo, com a comunidade e com D’us.
Em resumo, no judaísmo riqueza é contentamento, sabedoria, generosidade e responsabilidade. O dinheiro é apenas uma das suas faces; o essencial é o valor espiritual e moral que se dá a ele.
Em contrapartida, o conceito de riqueza mensionado na carta de Tiago, é tal qual a maioria de nós conhecemos, fruto da cultura ocidental dominada sobretudo pelo pensamento grego para a construção da sociedade.
No mundo ocidental, influenciado pelo pensamento moderno e capitalista, o conceito de riqueza é geralmente entendido de forma mais material e quantitativa do que no pensamento judaico.
1. Acúmulo de bens e capital
Riqueza é muitas vezes medida pela quantidade de dinheiro, propriedades, investimentos e bens que uma pessoa possui. A ênfase está no patrimônio e na capacidade de consumo.
2. Poder e status social
No Ocidente, ser rico não significa apenas ter recursos, mas também obter prestígio, influência e reconhecimento social. O padrão de riqueza está fortemente ligado a símbolos externos: carros de luxo, mansões, marcas famosas, estilo de vida exclusivo.
3. Individualismo e liberdade financeira
A riqueza é vista como meio de garantir autonomia e independência. Quem é rico pode escolher como viver, sem depender de outros ou do Estado. A liberdade de fazer o que quiser — viajar, empreender, usufruir de conforto — é considerada um dos maiores benefícios da riqueza.
4. Sucesso como medida de valor pessoal
Na cultura ocidental, riqueza costuma estar associada a mérito e sucesso. Muitas vezes se acredita que ser rico é prova de esforço, inteligência ou talento, enquanto a pobreza é vista como fracasso (ainda que essa visão ignore fatores sociais e estruturais).
5. Projeção para o futuro
Outro traço é a ideia de que riqueza traz segurança futura. Acumular é proteger-se contra incertezas, garantindo estabilidade para si e para a família.
Para facilitar o entendimento, veja a tabela comparativa entre a visão judaica e a visão ocidental sobre riqueza:
| Aspecto | Visão Judaica | Visão Ocidental |
|---|---|---|
| Definição central | Contentamento com a própria porção; riqueza interior | Acúmulo de dinheiro, bens e patrimônio |
| Finalidade da riqueza | Servir a D’us, praticar tzedaká (caridade) e gerar impacto positivo | Garantir liberdade pessoal, conforto e poder de consumo |
| Símbolos de riqueza | Sabedoria, prática das mitsvot, generosidade, reputação justa | Bens de luxo, status social, estilo de vida exclusivo |
| Dimensão espiritual | Essencial: conhecimento da Torá é a maior riqueza | Secundária ou irrelevante; foco no material |
| Responsabilidade | Riqueza implica maior obrigação moral de ajudar os outros | Responsabilidade é mais individual, centrada no próprio sucesso |
| Medição do sucesso | Equilíbrio espiritual, contentamento e contribuição à comunidade | Patrimônio acumulado, poder, reconhecimento social |
| Risco associado | Apego excessivo ao material afasta da essência espiritual | Ganância, competição e desigualdade social |
Essa tabela mostra bem que o judaísmo vê a riqueza como meio e responsabilidade, enquanto o Ocidente tende a tratá-la como fim e conquista pessoal.
Os ricos aos quais Tiago se refere em sua carta, são esses que não entendem o propósito da riqueza e esta se torna idolatria em suas vidas, afastando-os do Criador e da sua provisão abençoadora.